Alice dormia no quarto. Sentado na poltrona surrada de couro tem a sua frente um copo de uísque e gelo e um cinzeiro já cheio. Do mesmo modo que Alice tinha um estúdio no jardim ele havia transformado o porão da casa em uma sala de estar à prova de som. Assim ele não incomodaria ninguém nem seria incomodado. Mas agora aquela sala, antes tomada por musicas de rock e as risadas bêbadas de jogadores de pôquer, estava tomada pelo silêncio. A grande televisão presa à parede era como uma mancha negra no meio do branco do quarto. Percebe que seus cigarros acabaram. Sua mente finalmente está lucida e ele consegue pensar nos fatídicos acontecimentos dessa terça-feira.

“Só pode ser algum tipo de maníaco. Já encontrei esses tipos antes. Não sei como ele conseguiu meus e-mails. Não consegui rastrear o IP do cretino. Não faço a menor ideia de como esse merda consegui minhas senhas.”

Lembra-se da vez que teve que desembolsar alguns milhares de dólares para fazer alguns hackers “esquecerem” algumas fotos antigas da sua mulher.

“Não é tão absurdo pensar que ele está blefando. Aquele dia foi noticiado por todos os jornais. Li uma dessas manchetes quando estava no hospital: ‘Filho de importante empresário da região morre durante brincadeira no fim da tarde’. Não tenho certeza, mas deve ter saído alguma notícia que seu irmão gêmeo passou por tratamento psiquiátrico. Qualquer imbecil poderia juntar os fatos e pronto: ameaça instantânea. Ele só estava blefando. Ninguém sabe o que realmente aconteceu.”

Era uma brincadeira. HAHA. Todo mundo iria rir. Seu irmão havia batido nele por andar mentindo. Que tipo de homem ele seria se não se vingasse? HAHA. Todo mundo vai rir. Ele substitui a corda do balanço. HAHAHA. Seu irmão iria cair de bunda no chão ao tentar subir no velho pneu faixa branca. HAHA. Mas a corda presa no velho carvalho não arrebenta e ele começa a se balançar. Para frente, para trás. Ele tenta segurar o riso. A corda arrebenta e seu irmão faz uma parábola em direção ao barranco da beira do rio. Era uma brincadeira. O grito e o som de osso quebrando. HAHA. Todo mundo riu. O sangue fluindo pelo corte na cabeça. HAHA...

O gosto salgado em sua boca o faz perceber que está chorando. O silêncio foi quebrado. Sua risada ecoa nas paredes e chega aos seus ouvidos como um som grave e doentio. A casa continua em silêncio. A loucura está presa entre as pareces brancas. A loucura quer sair.

0 comentários:

Postar um comentário